Para especialistas, investimentos em infraestrutura não acompanham crescimento do bairro
Por Laura Antunes e Selma Schmidt
RIO - A corrida que já era acelerada ganhou ritmo ainda mais veloz com a certeza de que na linha de chegada estarão a Copa do Mundo e as Olimpíadas. A Barra da Tijuca e arredores, que nas últimas décadas nortearam a direção do crescimento da cidade, são protagonistas, neste momento especial para o Rio, de uma busca frenética por áreas ainda vazias para ocupá-las com empreendimentos residenciais e hoteleiros. Somente em 2012, foram licenciadas pela Secretaria municipal de Urbanismo 18.090 unidades residenciais nas regiões administrativas da Barra e de Jacarepaguá. Mais do que o dobro das licenças concedidas em 2011 (8.862). Já a rede hoteleira é responsável pela construção de pelo menos 14 hotéis até o fim de 2015, o que representa 3.720 novos quartos.
Enquanto o poder público garante que vai recuperar o tempo perdido e dotar a área de infraestrutura suficiente, urbanistas, especialistas em transporte e moradores se preocupam. Eles temem que essa meta ousada não seja alcançada e que a população local, estimada pela prefeitura para 2016 em 990.288 habitantes, sofra com a deficiência dos sistemas de saneamento básico, abastecimento de água e transporte, hoje em situação crítica.
O receio se justifica. Enquanto a expectativa de crescimento populacional da cidade, segundo o Instituto Pereira Passos (IPP), até 2016 é de 3,73%, na Barra será de 21,4%, e em Jacarepaguá, de 9,15%.
Morador da Barra há 20 anos, o engenheiro agrônomo David Silva acompanha esse crescimento veloz. Ao lado da casa onde vive, na Ilha Primeira (uma das 11 ocupadas na Lagoa da Tijuca), uma saída clandestina de esgoto despeja, há cerca de três meses, grande volume de dejetos no Canal de Marapendi.
— É preciso investigar para saber o que está acontecendo. Quando não chove, a água que sai da tubulação é muito preta, e o cheiro é insuportável. Quando chove, o esgoto se mistura com a chuva, e a situação melhora um pouco. Estou indignado com essa situação. A Barra cresce, e as condições ambientais pioram. O saneamento que estão fazendo é capenga — protesta ele.
Há quase 30 anos a Baixada de Jacarepaguá espera por saneamento. Há sete, o programa começou a decolar. Segundo a Cedae, foram investidos até agora R$ 610 milhões em obras. E o presidente da companhia, Wagner Victer, promete um cenário bem melhor. Segundo ele, a Barra já tem 400 quilômetros de rede coletora. Até 2016, afirma, 100% dos domicílios do bairro estarão interligados ao emissário. Hoje, diz Victer, 85% estão.
Água do Quebra-Mar não melhora desde 2007
Mas a poluição de praias e lagoas ainda é um fantasma. O Instituto Estadual do Ambiente (Inea) continua classificando a qualidade da água das lagoas de Jacarepaguá, Tijuca e Camorim como “péssima”. A da Lagoa de Marapendi é “ruim”. O trecho da praia junto ao Quebra-Mar também continua com a água avaliada como “má” para banho, como ocorre desde 2007.
— O Quebra-Mar sofre e influência da Lagoa da Tijuca, que desemboca nesse trecho da praia. As lagoas ainda estão muito assoreadas, e uma das razões é a ocupação desordenada das faixas marginais de rios e canais. De qualquer forma, na Lagoa de Marapendi, percebemos melhorias em alguns índices, como a redução dos coliformes e o aumento do oxigênio — diz Marilene Ramos, presidente do Inea.
O avanço imobiliário também não passa despercebido pelo editor de vídeo Daniel Garcia, que há seis anos vive na Ilha do Ipê, na Lagoa da Tijuca, onde há uma multiplicação dos imóveis:
— Sem fiscalização, as pessoas constroem nos espaços vazios dos seus terrenos nas ilhas. Dá para perceber isso pela chegada de materiais de construção e pelo vaivém de barcos. Na Ilha de São Jorge, por exemplo, fizeram um prédio de três andares recentemente. Com a futura chegada do metrô à Barra, a especulação cresceu. Estão construindo quitinetes e apartamentos de quarto e sala para alugar.
Urbanista sugere ocupação de outros bairros
Especialistas lançam um olhar crítico sobre esse crescimento da região. O presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo, Sydnei Menezes diz que a Barra sempre foi tratada como área de expansão da cidade e que o Plano Lúcio Costa, da década de 60, acabou desvirtuado devido à especulação imobiliária.
— Os terrenos foram supervalorizados, e a especulação imobiliária forçou a produção de imóveis. Mas até hoje a infraestrutura não chegou a essas áreas. Não se resolveram, por exemplo, as questões do abastecimento de água, da rede de esgoto, das lagoas e do sistema viário. Precisa-se é de um Plano de Estruturação Urbana (PEU) para repensar a região e prepará-la para o futuro.
O urbanista Pedro da Luz Moreira, da direção do Instituto dos Arquitetos do Brasil e professor da UFF, afirma que o crescimento da região da Barra e Jacarepaguá ocorre de forma inversa à ideal. O natural seria a chegada da infraestrutura à área antes de sua ocupação.
— Isso é um tiro no pé. A Barra sequer é dotada de transporte público. Ou seja, a infraestrutura não consegue acompanhar o crescimento da região — observa ele, criticando ainda o poder público por estimular o crescimento da área urbana, em vez de ocupar os espaços vazios de bairros já dotados de infraestrutura. — Estão transformando áreas naturais em urbanas, como é caso da Barra da Tijuca. Por que não uma cidade mais compacta, ocupando áreas ociosas, como São Cristóvão?
Na corrida contra o tempo, a Light começou este mês a construção da subestação Gardênia. Segundo a concessionária, o investimento será de R$ 50 milhões, e a obra deve durar 14 meses. Na região, será a quarta subestação, que vai fornecer energia a instalações olímpicas e cerca de cem mil pessoas em condomínios e estabelecimentos comerciais que estão sendo construídos na Avenida Abelardo Bueno.
Já a Fundação Rio Águas, da prefeitura, iniciou em 2011 a macrodrenagem dos 14 rios da Baixada de Jacarepaguá. Um programa R$ 340 milhões, que está pela metade: nove quilômetros de sete rios foram canalizados. A previsão é que os outros sete rios fiquem prontos no primeiro semestre de 2014. A maratona de projetos de infraestrutura tem razão de ser. Afinal, estimativas do IPP mostram que a população da Região Administrativa da Barra (inclui Recreio, Vargem Grande e bairros próximos) passará de 300.823 (Censo 2010) para 365.241 em 2016. Na RA de Jacarepaguá, o número de habitantes pulará de 572.617 para 625.047.
Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/rio/o-descompasso-da-barra-da-tijuca-7345262#ixzz2IYOwaoYn
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