Evento é considerado um dos motivos da crise econômica da Grécia
Por Cláudia Machado
ATENAS - O partido grego Pasok supõe que foram gastos € 6 bilhões, enquanto o Nova Democracia estima algo em torno de € 10 bilhões. Entre desacordos, outros partidos são mais taxativos: € 27 bilhões, no mínimo. Em 2007, o Comitê Olímpico Internacional (COI) havia estipulado que seriam gastos € 1,3 bilhão nas Olimpíadas. Falta de clareza à parte, o evento é considerado um dos motivos de a Grécia ter mergulhado em sua pior crise econômica, quatro anos mais tarde.
Gastos excessivos e falta de planejamento após as Olimpíadas frustraram quem achava que o megaevento impulsionaria o desenvolvimento do país. Em 2003, estudos do Ministério da Fazenda sobre os benefícios dos Jogos anunciaram que, nos 12 meses seguintes, Atenas seria uma potência turística, criando diretamente 445 mil novos postos de trabalho. Para os europeus, iria se tornar destino de fim de semana.
No entanto, as pesquisas falharam. Se em 2003, 13 milhões de turistas desembarcaram em Atenas, em 2004 os números caíram para 11,7 milhões. Quando se previa que em 2010 os visitantes seriam 20 milhões, eles não passaram de 15,5 milhões. Com a queda no turismo, cerca de 700 hotéis foram postos à venda, e centenas deles faliram.
A qualidade de vida também atingiu os gregos. Um ano depois dos Jogos, houve contração do PIB de 1,6%. Atualmente, as Olimpíadas somam cinco pontos percentuais à dívida da Grécia em proporção ao PIB, de aproximadamente 110%. Além disso, devido aos gastos excessivos, não sobrou dinheiro para melhorias nos sistemas de saúde e educação. O custo de vida se tornou mais caro, e o número de imigrantes em um país de 11 milhões de habitantes chegou a quase um milhão devido às contratações ilegais para as construções olímpicas.
Cidade melhorou mas não avaliou impactos
A crise que se seguiu aos Jogos leva os gregos a não valorizarem qualquer legado. Para políticos envolvidos no evento, os Jogos deixaram Atenas mais moderna, com a expansão no sistema de transporte, estradas, estádios, além de créditos internacionais por ter sido capaz de organizar um evento de tal porte. Segundo o presidente do Comitê Olímpico da Grécia, Spyros Capralos, não se pode negar que, depois das Olimpíadas, a capital ganhou um aeroporto moderno, excelentes meios de transportes, como metrô, veículo leve sobre trilhos (VLT) e ônibus elétricos, e novas estradas.
— Houve falhas, atrasos na maioria das obras e desperdícios. Pela pressão do tempo, faltaram estudos ambientais e de gestão após a conclusão dos complexos olímpicos. Mas devemos admitir que a cidade ficou mais moderna, e, se fosse hoje, aceitaria novamente realizar as Olimpíadas na Grécia — afirmou Capralos.
Por outro lado, cidadãos se decepcionaram com a desorganização e a corrupção trazidas pelos Jogos.
— A população em geral ficou orgulhosa de ver a cidade limpa, cheia de flores, com ruas pintadas e vários eventos culturais. Também notamos a diferença de estradas, meios de transportes e aeroportos. No entanto, se convertêssemos as dívidas olímpicas por obras de infraestrutura, seríamos uma das cidades mais modernas da Europa e sem a necessidade de pagarmos tão caro — avaliou o economista Vasilis Petridis.
Para ele, a inexatidão dos gastos, os atrasos nas obras, as trocas constantes de organizadores do Comitê Atenas-2004, a má administração, a falta de planos de impactos econômicos e ambientais a longo prazo e a ausência de licitações para a construção de instalações olímpicas causaram uma amarga experiência.
— A Grécia enfrenta grave crise financeira devido às condições econômicas internacionais, à corrupção política, à má gestão e a valores inaceitáveis nos Jogos 2004. O momento de grandeza da Grécia se apagou na noite de encerramento dos Jogos. O Brasil deve ficar atento aos gastos, e os brasileiros devem exigir clareza. As obras precisam ser realizadas dentro dos prazos, e as empresas construtoras, escolhidas por licitações, sem propinas. Não façam como nós gregos. O resultado é catastrófico, e o declínio, rápido — aconselhou o economista.
Os 23 complexos olímpicos são considerados “elefantes brancos”, e apenas cinco não estão obsoletos. O Centro de Imprensa, com contrato de aluguel de 30 anos, virou shopping center. Para a manutenção e conservação das instalações são necessários € 30 milhões anuais, valor que a economia grega não suporta, estando a maioria dos complexos abandonada.
O estádio de abertura e encerramento dos Jogos, o OAKA, é o principal exemplo dos custos exorbitantes das instalações olímpicas. Orçado em € 3 milhões, consumiu € 399 milhões. Obras fantasmas também fazem parte da herança dos Jogos. Um exemplo é a rodovia que liga a região de Schimatari a Parnitha. Os gregos pagaram € 2,2 milhões pela rodovia, que nunca saiu do papel.
— Restaram dívidas, decepção e algumas estradas na capital. Sediar Jogos não é tarefa fácil e requer honestidade — disse o comerciante Vasilis Tsantilas.
Para a estudante de Direito Spyridoula Soulis, apesar da expansão dos transportes e de a vila olímpica ter oferecido moradia a centenas de famílias de baixa renda, os gastos com os Jogos não trouxeram benefícios econômicos:
— Digo não aos Jogos Olímpicos. O evento nos deixou prejuízos. Algumas pessoas ficaram milionárias, mas nós, contribuintes, pagamos por isso.
Sistema de segurança jamais funcionou
Outro fiasco de Atenas-2004, envolve o sistema de vigilância superpanóptico C41. A segurança dos Jogos custou US$ 1,5 bilhão, sendo US$ 300 milhões gastos com o C41, que nunca funcionou e continua inviável. Durante a abertura dos Jogos de Londres 2012, o jornal grego “To Vima” publicou uma série de reportagens sobre o por quê de uma cidade querer sediar Olimpíadas. Segundo o jornal, os desafios são maiores do que o gosto da vitória. Os Jogos não mudam a reputação de uma cidade, nem fazem turistas escolhê-la como destino ou sequer atraem milionários ou investidores. “Se na equipe não trabalharem pessoas sérias, o país pode falir”, estampou a publicação.
Com o slogan “bem-vindos de volta” e uma cerimônia de abertura emocionante, na qual séculos de História foram contados, as Olimpíadas de Atenas deixaram cicatrizes irreparáveis na sociedade e na economia do país. A Grécia não conseguiu tirar proveito do maior evento esportivo do planeta. Hoje endividada, parece não sentir orgulho do evento que ela mesma deu ao mundo.
Olimpíadas impulsionaram dois prefeitos
Apesar dos problemas econômicos na Grécia depois das Olimpíadas 2004, os dois prefeitos que prepararam Atenas para o megaevento esportivo tiveram ascensão em suas carreiras políticas.
Dimitris Avramopoulos, responsável pela candidatura olímpica e prefeito de Atenas de 1995 a 2002, popularizou-se ao trazer de volta aos gregos os Jogos que criaram. Graças a isso, ele foi reeleito prefeito em 1998 com 57,7% dos votos, recorde em eleições municipais. Ao deixar a prefeitura, Avramopoulos ocupou cargos de ministro de Turismo, Saúde e Defesa e foi vice-presidente do maior partido grego, o Nova Democracia. Em junho deste ano, se tornou ministro das Relações Exteriores.
Filha do ex-primeiro ministro da Grécia Constantinos Mitsotakis e experiente como ministra do Turismo, Dora Bakoyannis assumiu a prefeitura de Atenas em 2003. Primeira mulher a se tornar prefeita da cidade, teve 18 meses para preparar a capital para os Jogos.
Quando eleita, Bakoyannis declarou que, apesar do curto prazo, seria capaz de organizar Atenas cultural e tecnicamente. A promessa foi cumprida. Com base no slogan da sua campanha “obras, colaboração, administração e resultados”, em agosto de 2004 ela entregou a capital limpa, florida e funcionando organizadamente. Seu trabalho foi reconhecido um ano mais tarde ao receber o prêmio bienal “Prefeita do Mundo de 2005”.
De 2006 a 2009, Bakoyannis foi ministra das Relações Exteriores. Em 2010, foi expulsa do partido Nova Democracia por ter votado contra as medidas de austeridade impostas pelo FMI e pela União Europeia. Fundou seu próprio partido, a Aliança Democrática. Neste ano, se coligou novamente ao ND, pelo qual é deputada.
Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/pais/licoes-olimpicas-atenas-ate-hoje-nao-sabe-custo-dos-jogos-6277739#ixzz28cb2MRw5
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