Jogos deram exposição, mas instalações deixaram dívidas e se tornaram elefantes brancos
Por Jorge Luiz Rodrigues
RIO - Quatro anos depois dos Jogos Olímpicos-2008, embora seja possível notar melhorias expressivas no transporte público e na infraestrutura da capital chinesa, as instalações espetaculares construídas para o megaevento estão subutilizadas ou abandonadas, consumindo verbas públicas.
A liderança no quadro de medalhas, com 51 ouros, destronando EUA e Rússia, foi o grand finale para a nação anfitriã, que trabalhou durante sete anos para realizar o megaevento sem problemas de infraestrutura. Dias antes do início das competições, o presidente da China, Hu Jintao, discursou, pedindo ao mundo que não misturasse questões políticas com as competições. Num país que censurou sites contrários ao regime, isolou do mundo o Tibete desde os protestos de março de 2008 e pôs Xinjiang sob vigilância após ataque terrorista que matou 16 policiais antes dos Jogos, não houve como dissociar política e esporte durante as Olimpíadas.
O Partido Comunista quis impressionar o mundo com a pujança de uma nação emergente e mostrar aos chineses que o planeta os respeitava. Durante os 16 dias (8 a 24 de julho), o show distraiu a atenção da população de problemas como corrupção, arbitrariedades, falta de preservação ambiental e desigualdade de renda.
Pela primeira vez, a China teve de abrir suas fronteiras a qualquer cidadão que possuísse uma credencial olímpica. No entanto, o controle do governo sobre o Comitê Organizador dos Jogos Olímpicos de Pequim-2008 foi total, com o ex-prefeito (nomeado pelo PC) Liu Qi no comando. Havia apenas dois funcionários estrangeiros: um húngaro e um senegalês. Às vezes, o Comitê Olímpico Internacional (COI) se via obrigado a intervir. O Serviço de Notícias Olímpicas se transformou em rara exceção. Foi terceirizado para a empresa holandesa Infostrada. Afinal, os chineses não são o que se pode chamar de especialistas em liberdade de informação.
De 2001 a 2008, as mudanças na cidade foram marcantes. Cerca de 80% das lâmpadas das ruas em volta dos locais de competição passaram a ter energia gerada por meio de captação solar. O mesmo aconteceu com 90% da água para a banho na Vila Olímpica.
A construção de cinco arcos rodoviários (o Rio ainda nem ganhou o seu) e de mais quatro linhas de metrô (aumentando o total para oito), os trens de suspensão magnética e o sistema de controle de tráfego beneficiaram o transporte. Faixas exclusivas para o deslocamento da família olímpica, além de férias escolares e de repartições públicas ajudaram o trânsito.
Novos bairros surgiram ao redor dos anéis viários. Como os das vilas Olímpica e de Mídia, erguidas em prédios com apartamentos de até quatro quartos, bem maiores do que o apertado padrão chinês. O slogan olímpico de 2008, “Um mundo, um sonho”, tomou conta da capital, que ganhou um aeroporto internacional novinho em folha, hoje, o segundo do mundo em volume de passageiros, superado pelo de Atlanta (EUA), a sede olímpica de 1996.
De 2002 a 2008, fábricas foram fechadas para melhorar a qualidade do ar. Mesmo assim, Pequim teve vários dias cinzentos durante o abafado verão olímpico. Hoje, o problema persiste.
Com os US$ 34 bilhões (R$ 68,79 bilhões) de investimento, Pequim ganhou 19 novos estádios, remodelou 13, adaptou 59 locais de treinos e construiu quatro pontos fundamentais: a Vila Olímpica, a Vila de Imprensa, o Centro Principal de Imprensa (MPC) e o Centro Internacional de Rádio e TV. Ergueu novos estádios para o futebol, em Tianjin e em Qinhuangdao, e a marina para o iatismo, em Qingdao, a 600 quilômetros do Sul da capital.
O centro nervoso dos Jogos foi o Olympic Green (Verde Olímpico), com 1.135 hectares, a 22 quilômetros do Centro. Abrigou 13 dos 32 locais de competições, além da Vila, de um hotel seis estrelas, do MPC e do IBC. A atração principal foi o estádio Ninho do Pássaro, com 80 mil lugares, sede do atletismo, das finais do futebol e das cerimônias de abertura e encerramento. Ao lado, fica o ginásio, com 18 mil lugares, para ginástica, handebol e vôlei. Também com 18 mil lugares, o Cubo D’Água nasceu para ser futuro centro nacional de natação e abrigar ainda saltos ornamentais, nado sincronizado e polo aquático.
Hoje, a realidade é desanimadora. Tanto o Ninho quanto o Cubo se tornaram elefantes brancos. Em 2009, o Ninho recebeu a Corrida dos Campeões, que reuniu o heptacampeão de Fórmula 1 Michael Schumacher e o inglês Jenson Button, entre outros. Em 2010, foi palco da decisão da Supercopa da Itália, entre Milan e Internazionale. Abrigou o primeiro rodeio da China e o parque temático “Maravilhas do inverno”. Em junho passado, a administração estimou que seriam necessárias três décadas para recuperar os 3 bilhões de iuans (US$ 480 milhões) gastos na construção.
O Cubo teve prejuízo de 11 milhões de iuans (R$ 3,17 milhões) em 2011, mesmo com contínuo subsídio do estado. A instalação foi transformada em parque aquático de diversões.
Erros e acertos de Pequim e de sedes anteriores serviram para Londres planejar suas Olimpíadas.
— Barcelona (1992) e Munique (1972) conseguiram integrar instalações à vida da cidade, enquanto Pequim (2008) e Atenas (2004) tiveram problemas — disse ao GLOBO, em maio passado, Richard Burdett, diretor do LSE Cities, um centro de pesquisas da Escola de Ciências Políticas e Econômicas de Londres.
Quatro prefeitos, da eleição à realização
A partir de 13 de julho de 2001, quando Pequim precisou de apenas duas rodadas de votação para ser eleita sede das Olimpíadas-2008 com mais da metade (56) dos 105 votos dos membros do Comitê Olímpico Internacional (COI), a capital chinesa teve quatro prefeitos, que trabalharam desde a vitória da candidatura até a realização do megaevento.
Liu Qi, que assumira em 1999, foi o primeiro deles. Responsável pela campanha vitoriosa, governou até janeiro de 2003. Saiu da prefeitura para assumir os postos de secretário do Comitê Municipal de Pequim do Partido Comunista Chinês e de presidente do Comitê Organizador dos Jogos Olímpicos-2008. Tornou-se mais influente nos Jogos do que seus sucessores. Foi ele que discursou nas cerimônias de abertura e encerramento.
Em janeiro de 2003, o PC apontou Meng Xuenong para suceder Liu. No entanto, Meng resistiu apenas três meses na prefeitura. O partido o defenestrou, juntamente com o então ministro da Saúde, Zhang Wenkang. Foram responsabilizados por falhas no combate à epidemia de gripe aviária.
Wang Qishan o substituiu em caráter emergencial em abril, sendo confirmado prefeito em janeiro de 2004. Acabou promovido no PC em 2007, chegando a vice-premier no ano seguinte. Guo Jinlong assumiu a prefeitura em 2007 e foi confirmado no cargo em janeiro de 2008. Comandou a cidade nos Jogos. Só saiu em julho passado, após renunciar.
Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/pais/licoes-olimpicas-em-pequim-estadios-gastos-monumentais-6292909#ixzz28cbZc7eE
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