JOSÉ CARLOS BRUNORO, PRESIDENTE DO CONSELHO DA AGÊNCIA BRUNORO SPORT BUSINESS, VÊ POTENCIAL DESPERDIÇADO POR CLUBES E EMPRESAS
De um lado, clubes de futebol com departamentos de marketing demasiadamente concentrados em conseguir patrocínios. De outro, empresas que sabem que precisam investir em esporte de alguma maneira, em função da chegada da Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos ao Brasil, mas ainda se restringem a buscar exposição de marca.
Esse é o diagnóstico feito por José Carlos Brunoro, presidente do conselho da agência Brunoro Sport Business (BSB), a respeito do marketing esportivo no país atualmente. “Os clubes ainda estão muito longe do ideal”, analisa. “E é mais difícil vender planejamento estratégico para as empresas, porque a maioria insiste em conseguir só visibilidade, pensando em curto prazo”.
Em entrevista a Época NEGÓCIOS, o executivo, considerado como um dos precursores do marketing esportivo no Brasil, detalhou a situação do mercado e de suas várias faces: entidades, agências, empresas, instituições de ensino e empregos. E, em especial, todos os efeitos que a Copa e a Olimpíada irão causar em cada uma dessas vertentes.
A carreira de Brunoro no esporte começou em 1964, como atleta, e em 1978, como gestor, na posição de técnico da equipe de vôlei da Pirelli. De lá para cá, participou da reconhecida “Era Parmalat” no Palmeiras, quando a companhia montou esquema de co-gestão com os paulistas, trabalhou com o piloto Pedro Paulo Diniz e com o Pão de Açúcar, entre outras experiências.
Os clubes de futebol estão, hoje, mais profissionais? Estão mais bem preparados para aproveitar as oportunidades que a Copa traz?
Os clubes estão começando a vislumbrar coisas melhores, mas ainda estão muito longe do ideal. Principalmente em gestão. Quando ela não é profissional, competente, também não tem um marketing adequado. O marketing no esporte vem junto da gestão bem feita. Por isso que, lá atrás, a Parmalat foi essencial. Era uma empresa com tradição enorme de investir, mas que não acreditava em pagar sem participar da gestão. Ela queria ver como a marca era trabalhada, para onde ia o dinheiro, se o produto estava em dia com as ações de marketing, e ela serviu como exemplo do que pode ser feito. Precisamos nos comprometer melhor na gestão dos clubes.
E em relação ao marketing?
O marketing dos clubes tem basicamente a função de buscar recursos, por meio de patrocínios ou licenciamentos, e poderia ser mais do que isso. Clubes são grandes marcas que poderiam ser trabalhadas para valorizar produtos, ter diversificação, faturar em mais segmentos.
Muitos dirigentes falam em internacionalização da marca do clube, principalmente aqueles que obtiveram mais vitórias em um passado recente, como Santos e Internacional. Os clubes de modo geral estão prontos para ir para o exterior? O mercado brasileiro já foi totalmente dominado?
Eu ouço falarem isso, mas não vejo plano neste sentido. Os clubes brasileiros têm a vocação para ouvir uma coisa e dizer que podem fazer, mas não é bem assim. Às vezes querem fazer, expandir o nome, mas, como tudo, precisam de planejamento, investimento. Essa é uma palavra que os clubes não gostam de ouvir. Quando se fala em investir para ter publicidade, clube não gosta. É preciso planejar quais áreas serão penetradas, em quais mercados, quanto vai precisar investir para isso, montar um calendário, conseguir transmissão de televisões, uma série de coisas.
O Corinthians é um caso recente. O Luis Paulo Rosenberg, agora vice-presidente, falou muito em explorar o mercado chinês por meio da contratação de um jogador de lá. Essa é uma tentativa válida?
Muito, mas é uma situação pontual. Atrás disso, não sei se há algo planejado. Como o Rosenberg é altamente qualificado, ele sabe que isso vai demandar outras coisas. É como uma empresa lançar um produto: o mercado precisa estar preparado.
Em tempos de divulgação de balanços financeiros, como agora, aparecem números que mostram receitas cada vez maiores nos clubes. Mas, ao mesmo tempo, percebe-se que os maiores impulsos vêm de poucas receitas, como negociação de direitos de TV. Os clubes ainda são reféns desse tipo de renda? O que deve ser feito para mudar o cenário?
Sem dúvida, mas não é um fator brasileiro. É mundial. Clubes em todo lugar do mundo são reféns de TV e patrocínios. É lógico que lá fora eles têm bilheteria mais forte, arenas com rendimentos altos, outras atividades, mas essas são fundamentais. Não tem muita fórmula do que fazer. É preciso melhorar a participação de outras receitas, com maior frequência do público no estádio, consumo nas arenas, licenciados, mas TV e patrocínio sempre serão as principais.
Na mesma linha, outros esportes também têm sofrido com poucas fontes de receita. O caso mais recente é o time de vôlei da Cimed, que acabou depois que o laboratório perdeu a parceria da Sky. Há salvação para esportes que não têm uma base tão grande e fanática de torcedores como o futebol? Qual?
Isso está acontecendo, perigosamente, nos esportes amadores, principalmente no vôlei. E acontece por não ter um trabalho de base. Eles ficam reféns só das contratações, porque poucos têm trabalho de base, e aí não conseguem manter a equipe. Se os times de vôlei tivessem categorias de base, caso perdessem patrocinadores, daria para manter um time menos competitivo e buscar caminhos durante o ano. É perigoso montar só o profissional e não ter como sobreviver quando um patrocinador sai.
O Brasil tem pela frente uma maratona de grandes eventos. Copa das Confederações, Copa do Mundo, Copa América, Jogos Olímpicos e, inclusive, os X-Games, que a BSB passa a organizar pelos próximos três anos. O país está pronto para receber tantos eventos?
A partir de 2014, teremos uma estrutura cada vez melhor para receber esses grandes eventos, em função de estarem sendo feitas todas as etapas, todo esse caderno de encargos, que preveem mais segurança, mobilidade urbana, entre tantas necessidades. A partir daí, vamos conseguir receber com mais facilidade.
Acontece que, ao mesmo tempo em que o Brasil recebe tantos eventos, apenas para citar um exemplo, o UFC teve de voltar para Las Vegas depois de não ter conseguido um lugar em São Paulo ou no Rio de Janeiro para fazer o confronto entre Anderson Silva e Chael Sonnen. Não é um mau presságio para um país que terá tantos eventos esportivos?
O problema é que todo mundo acha que só existe vida no eixo Rio-São Paulo. O Paraná não é um Estado que suporta grandes eventos? Minas Gerais? Rio Grande do Sul? Todo mundo acha que só São Paulo e Rio podem suportar, e nós temos estruturas e locais espetaculares em outros eixos. Levar os X-Games para Foz do Iguaçu cumpre exatamente essa ideia.
Enquanto se fala muito sobre profissionalismo nas entidades esportivas, como está o mercado do lado das marcas? As empresas estão prontas para trabalhar com os grandes eventos?
As empresas querem fazer, mas ainda não sei se estão prontas. A visão da empresa, na maioria dos casos, se restringe a visibilidade. Aquelas que querem investir bem, de maneira qualificada, têm de ter investimentos estratégicos. E dá para fazer isso no Brasil, porque estamos em um período, até 2016, em que dá para fazer todas as ações em volta dos eventos. Não é mais um terreno pontual. E ainda assim empresas insistem em conseguir só visibilidade, pensar em curto prazo. É mais difícil vender planejamento estratégico para as empresas. Nesse lado, elas têm planejamentos mais bem feitos em diversos segmentos, mas não no esporte. E a maioria não vai ter como ficar de fora de ações esportivas nos próximos anos, pelo menos entre as grandes.
Novamente traçando um paralelo entre entidades e empresas, os clubes já têm diretores de marketing dedicados, embora muitos sejam ainda voluntários. Algumas empresas, por sua vez, têm gerências voltadas para marketing esportivo. Isso é uma tendência?
Isso já existe em algumas empresas, gente dedicada ao desenvolvimento esportivo. Não há um departamento de marketing esportivo, mas alguém que fala com o mercado, com as agências e com os patrocinados. Muitas já têm, e é uma tendência mesmo. Agora, um departamento só para isso eu não acho que valha a pena. É melhor ter um ou dois responsáveis, apenas.
É consenso no mercado que marketing esportivo não é só estampar marca em camisa, fazer patrocínio e medir retorno de mídia. Quem, hoje, faz melhor uso dessa ferramenta, no sentido de também buscar ativação, entre outras partes que a compõem?
A visibilidade é só uma parte. Marketing esportivo é comunicação 360°, que atinge todos os públicos, interno e externo, que constrói marca, e é preciso aprender a atuar nesse sentido. O Banco do Brasil é um exemplo claro do que deve ser feito, e é legal porque eles são uma estatal. Eles fazem muito bem o trabalho interno, externo, diretamente no evento e fora dele, com o consumidor.
Virou moda falar em marketing esportivo, e então surgiram várias pequenas agências para lidar com assuntos específicos, como gerenciamento de carreiras e captação de patrocínios. Como você vê a chegada dessas agências ao mercado?
É natural que apareçam muitas, porque as pessoas acham que é uma grande oportunidade, mas acho que vão ficar somente as mais preparadas, as mais competitivas, com maior conhecimento de mercado. Também ocorre o fato de agências de fora virem ao Brasil, mas é uma situação perigosa.
Por quê?
Porque elas podem vir só para essas oportunidades pontuais, ficar durante os eventos e ir embora depois. Pode ser até que venham porque têm um cliente global que estará presente. E também porque muitas entram sem conhecer o mercado brasileiro. Aqui temos situações diferentes. Falar de futebol aqui é diferente. E isso gera um outro tipo de situação, que são agências estrangeiras buscando união com empresas nacionais.
Com a Copa a dois anos de ser realizada no Brasil e os Jogos Olímpicos a quatro, fala-se muito em mais oportunidades para trabalhar com marketing esportivo. Esse pressuposto está correto? Os megaeventos estão mesmo gerando empregos a brasileiros nessa área?
Temos, paralelamente, gestão esportiva e marketing. Estamos precisando de gestores esportivos para todas essas atividades. Essas competições trazem empregos principalmente na parte paralela a elas. As empresas que as patrocinam, mesmo, são poucas, então há mais chances de trabalhar no entorno, e isso tem acontecido.
Quais são essas áreas paralelas?
Dá para trabalhar em confederações, entidades, fazer exploração específica de atletas, montar eventos que tenham como pano de fundo essas competições, projetos educacionais voltados para legado esportivo, gestão de arenas – e não só as que recebem a Copa, mas as de outras cidades, que querem ser sub-sedes e fazem arenas menores. Aí já há uma gama maior de empregos.
As instituições de ensino estão preparando profissionais de modo adequado para trabalhar com marketing esportivo no Brasil? Se não, onde estão as deficiências?
Todas estão abrindo MBAs, coisas voltadas para esse mercado, mas adequadamente são poucas. Fico assustado com aquelas que abrem só pelo comércio, com mensalidades baixíssimas e professores pagos de forma ridícula. Mas já vimos iniciativas grandes em capacitação, e há casos legais, como o do Sebrae, que têm preparado cursos para a rede hoteleira, para taxistas, uma série de empregos na base que são necessários.
Por fim, sobre o período que irá suceder os grandes eventos, inclusive, existe o temor no mercado de que as oportunidades irão sumir depois que a Copa e os Jogos acontecerem. Você tem a mesma visão? O que será do marketing esportivo no período pós-2016?
É uma incógnita. Se as empresas forem inteligentes e tiverem planejamento estratégico, esperamos que o esporte esteja consolidado como prática, que haja um legado. Eu espero que seja um grande mercado a partir de 2016. É uma incógnita, mas estou otimista que isso não ocorra.
Fonte: http://epocanegocios.globo.com/Informacao/Visao/noticia/2012/05/o-que-falta-ao-marketing-esportivo-brasileiro.html
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