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domingo, 1 de julho de 2012

Londres investe pesado para que Olimpíadas sejam a mais vigiada da história


Capital terá força de segurança com mais de 60 mil homens, contingente seis vezes maior do que o enviado pela Grã-Bretanha ao Afeganistão

Por Jorge Luiz Rodrigues

LONDRES — Sinta-se vigiado. Esse poderia ser o mote de segurança das Olimpíadas de Londres, que começarão daqui a 26 dias com o maior aparato de forças armadas, policiais e privadas do Reino Unido desde a Segunda Guerra Mundial. São 48 mil policiais e 13,5 mil soldados, contingente mais de seis vezes superior ao enviado pela nação para combater no Afeganistão (9.500 homens). Muitos britânicos questionam o tamanho da tropa, alegando que o espírito que rege as Olimpíadas, de amizade, respeito e excelência, foi deixado em segundo plano pela paranoia de vigilância.
O plano inclui seis baterias antiaéreas em edifícios, parques e instalações comerciais, além do fechamento de três mil vagas de garagem de um shopping center vizinho ao Parque Olímpico. Uma arma sônica capaz de dispersar multidões e drones, pequenos aviões não tripulados, voando pelos céus londrinos, são outras táticas britânicas do Big Brother olímpico, que ainda inclui 17km de cercas eletrificadas na região do Parque Olímpico de Stratford. Um porta-aviões estará no Rio Tâmisa, assim como aviões e helicópteros de guerra patrulharão os principais pontos da cidade.

Moradores x mísseis
Em novembro, Philip Hammond, secretário da Defesa, anunciou que a Grã-Bretanha repetiria o exemplo de outras Olimpíadas, como Pequim-2008, quando mísseis terra-ar foram posicionados um quilômetro ao sul do Parque Olímpico da capital chinesa. No entanto, os sistemas usados em Londres superam os dos chineses. Em Pequim não havia uso de drones, muito menos cercas elétricas. Quatro anos depois, novíssimos scanners, cartões de identificação biométrica e sistemas de vigilância capazes de reconhecerem rostos e placas de carros são as novidades londrinas.
Na última quinta-feira, advogados de um grupo de moradores de Leytonstone, a 4km do Parque Olímpico, desafiaram os planos de segurança. Conseguiram que uma corte superior examine, na próxima semana, o pedido para impedir a instalação de uma bateria antiaérea no condomínio em que moram. Eles seguem o exemplo de moradores de um condomínio de Bow Quarter, a 2km do Parque, que lutam para não ter uma outra bateria antiaérea sobre a torre da caixa d’água. Nos dois casos, os condôminos alegam terem sido avisados da decisão do Ministério da Defesa por folhetos deixados em suas caixas de correio.
— Ninguém nos consultou. Apenas, deixaram um panfleto. Isso criou muito medo. Não entendo como disparar mísseis de uma área densamente povoada — questionou Brian Whelan, morador de Bow Quarter.
Os moradores de Bow Quarter esperavam pelos Jogos com ansiedade e excitação por causa da vista privilegiada para o palco do megaevento. Mas, agora, prometem brigar na Justiça para impedir a invasão dos militares. O reservatório de água fica elevado entre edifícios baixos, numa construção de estilo vitoriano.
O ministério não quis se manifestar, mas os folhetos dão o assunto como certo, com o texto de que o condomínio de Bow Quarter oferece “uma excelente vista da área ao redor e de todo o céu acima do Parque Olímpico”, informando ainda que a torre da caixa d’água é “o único local apropriado nesta área para mísseis de alta velocidade”.
O custo dos Jogos, com a segurança incluída, supera os 9,3 bilhões de libras (R$ 29,7 bilhões), quase quatro vezes mais do que o orçado em 2005, quando Londres derrotou Paris na eleição pela sede olímpica. O dinheiro representa 0,7% do PIB britânico, num momento em que a nação questiona o corte de gastos e a diminuição de investimento em hospitais, seguro social e até no policiamento do dia a dia.
Quem investiu mais de 1,5 bilhão de libras (R$ 4,8 bilhões) de olho na promessa de faturamento com os Jogos anda preocupado. Em março, a empresa australiana que construiu e inaugurou, há dez meses, o maior shopping center da Europa, ao lado do Parque Olímpico de Stratford, estava comemorando a estimativa de que 67% dos espectadores que viessem assistir aos Jogos passariam pelo empreendimento. A realidade, por enquanto, é amarga. Desde o último dia 16, o estacionamento do shopping está fechado pelo “Parque Olímpico Cercado”. A ordem de segurança impede o shopping de arrecadar com as três mil vagas para carros, que viviam lotadas. O efeito dominó atingiu as 380 lojas e 16 cinemas, que viram despencar o movimento. Não é só: no dia 27 de julho, data da cerimônia de abertura, quando mais de 150 mil pessoas são esperadas dentro do Parque Olímpico, o shopping terá de fechar suas portas três horas antes do início da festa, marcada para 17h (de Brasília).
— A loja vendia 8 mil libras (cerca de R$ 25 mil) em dias normais. Se hoje conseguimos a metade disso, consideramos um dia excelente — conta a brasileira Tayssa Pelissari, uma entre os 60 funcionários contratados pela rede de pizzarias para a filial do shopping Westfield, sob a expectativa de movimento recorde.

Roupa suja no scanner
Nos três hotéis inaugurados este ano no shopping, a lotação só acontecerá a partir de 15 de julho, mas os hóspedes já sofrem com o esquema de segurança do Parque Olímpico.
— A lavanderia que nos atende também está nesta área de segurança e, agora, os pedidos entregues pela manhã só voltarão três noites depois, pois as roupas sujas e limpas têm que passar por scanner. E o movimento do shopping caiu em 25% com o fechamento do estacionamento. Você imagina um shopping gigante como este sem estacionamento durante dois meses? — questiona Wayne Androliakos, gerente-geral de um dos hotéis.
Autorizados pelas “questões de segurança”, com base na “Lei dos Jogos em Londres”, de 2006, exército, policiais e forças privadas podem usar a força física em casos que incluem do terrorismo a protestos pacíficos, ações sindicais, camelôs vendendo produtos que não tenham o selo de aprovação das Olimpíadas, batedores de carteiras, cambistas e desordens públicas e até pessoas que estejam mendigando. Para quem desafiar a Lei Olímpica, haverá plantão judicial para audiências em até 24 horas após o delito ter sido cometido.
Citius, Altius, Fortius, o lema olímpico que, em latim, significa “o mais rápido, o mais alto, o mais forte”, na Londres-2012, ganhou mais um significado: a mais vigiada.

Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/olimpiadas2012/londres-investe-pesado-para-que-olimpiadas-sejam-mais-vigiada-da-historia-5361293#ixzz1zNYAsLWL 

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