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segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Executivos mudam de área para aproveitar a bola da vez do Brasil


Por Letícia Arcvoverde

Com a realização de eventos como a Copa do Mundo de 2014 e a Olimpíada em 2016 no Brasil, a profissionalização do setor esportivo deixou de ser uma tendência para se transformar em um movimento acelerado.

O aquecimento da área está criando oportunidades em clubes, confederações e empresas patrocinadoras. Consequentemente, atrai profissionais com carreiras que até então passavam longe dos estádios, dispostos a entrar em um mercado novo e que, muitas vezes, representa uma grande paixão.

Sérgio Friedheim já havia sido diretor de cinco diferentes áreas na Motorola quando recebeu a oferta para assumir a gerência de marketing de artigos esportivos da Alpargatas. A decisão não foi fácil, mas o executivo viu na proposta uma oportunidade única. "Saí da minha zona de conforto e achei o desafio muito estimulante", diz. Em setembro do ano passado, deixou a diretoria de 'retail e trade marketing' para a América Latina e uma carreira de 14 anos na área de telecomunicações para cuidar das marcas Topper, Rainha e Mizuno na nova empresa.

A equipe de Friedheim, que dobrou de tamanho para 13 pessoas desde que ele entrou, tem a missão de aumentar o espaço das três marcas, já tradicionais no esporte brasileiro. "Queremos fortalecer a Topper no futebol, relançar a Rainha e entrar com a Mizuno em outros esportes", explica. Atualmente, a Topper patrocina os times do Grêmio, do Atlético Mineiro, a Federação Paulista de Futebol e a Confederação Brasileira de Rugby, além de ter fechado recentemente com a Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro.

Ainda que os fundamentos do marketing sejam os mesmos, Friedheim diz que cada área tem suas particularidades e que atuar em um segmento novo faz com que ele aprenda mais a cada dia.

A principal diferença, de acordo com o gerente, é lidar com a paixão do consumidor. "A relação com o cliente é muito mais emocional do que no caso de outros produtos". Esse fator também contribuiu para sua decisão de apostar na nova área. Friedheim, que é corredor e nadador, conta que recebe críticas amigáveis dos colegas por ser o único corintiano da equipe, mas que está satisfeito por lidar com um assunto que desperta reações calorosas dos consumidores. "É muito gratificante trabalhar com marcas que trazem alegria para as pessoas, que criam momentos positivos", ressalta.

O carioca Vinicius Costa também deixou uma carreira de mais de uma década em uma multinacional para apostar no setor esportivo. "Vi a posição de gestor de esporte como carreira do futuro e resolvi investir", explica. De formação técnica, ele entrou na Siemens como estagiário. Em onze anos, formou-se engenheiro de telecomunicações e passou a ser o responsável pela área de assistência técnica de equipamentos hospitalares para a América Latina.

A carreira em Y, no entanto, o fez perceber que suas oportunidades na empresa haviam se tornado restritas e, em 2009, tomou a decisão de mudar de área. O esporte foi a resposta mais fácil, por ser uma paixão cultivada desde cedo.

Costa passou os últimos dois anos em um período de transição, durante o qual fez pós-graduação em marketing no Ibmec e MBA em gestão e marketing esportivo na Trevisan Escola de Negócios, além de ter participado de diversos eventos sobre o assunto, onde conheceu outros profissionais da área. Em julho do ano passado, deixou a Siemens para ser supervisor administrativo do futebol de base do Flamengo, o time do coração.

"Foi uma decisão arriscada", admite. Ele deixou uma carreira estável - além de um salário maior e mais benefícios - para apostar em um futuro incerto, já que o trabalho em clubes de futebol também costuma envolver questões políticas. "Estou confiante no mercado e sei que a experiência em um time como o Flamengo contará muito no futuro", explica.

Na opinião de Costa, o mercado de trabalho vai ter cada vez mais espaço para profissionais com formação na área. "A maioria das pessoas que atua nos clubes trabalha lá há 30 anos. É preciso se adaptar à nova realidade", afirma. Até ferramentas triviais em ambientes corporativos como o e-mail ainda não eram tão difundidas no clube. Embora torça para o time onde trabalha, Costa acha que esse tipo de exigência está acabando. "Assim como qualquer outro setor, eles querem os melhores profissionais", diz.

Além da Copa e da Olimpíada, especialistas destacam eventos como a Copa das Confederações e torneios de federações como responsáveis por abrir espaço para a profissionalização do segmento. "Antes, o esporte no Brasil não buscava uma gestão profissional. Hoje isso existe, mas ainda é incipiente", explica John Alton, sócio da Deloitte. Responsável por projetos relacionados a grandes eventos esportivos, ele diz ter percebido um movimento grande das federações em busca de trabalhos de consultoria.

"O esporte é um produto que o Brasil precisa exportar para o mundo", diz Rodrigo Vianna, diretor da Hays. O consultor diz perceber uma busca ainda mais forte na área de marketing esportivo, com novas empresas surgindo para atender a demanda e grandes companhias recrutando profissionais com experiência. "É um caminho sem volta. Já existe muito espaço e a tendência é que o mercado continue aquecido por bastante tempo", diz.

Formado em ciência da computação, Marcelo Claro sempre procurou aliar tecnologia e marketing na vida profissional. Há três anos, encerrou um trabalho como gerente administrativo e financeiro em uma empresa de biotecnologia e considerou uma mudança de carreira. Conversando com amigos do segmento esportivo, viu a oportunidade de investir na área que sempre gostou. "Adoro esporte desde criança, dos mais tradicionais até os pouco conhecidos no Brasil", revela.

Entre 2009 e 2010, cursou o MBA em gestão e marketing de entidades esportivas da Anhembi Morumbi, em São Paulo. Ao mesmo tempo, lançou a própria empresa de marketing e consultoria voltada para o setor. Atualmente, é diretor executivo no G4 Aliança Paulista, uma associação que reúne os quatro principais times da capital paulista - Palmeiras, Santos, São Paulo e Corinthians, para o qual torce.

A escolha por uma especialização na área é um caminho comum para quem quer apostar no mercado. Nos últimos anos, além de terem ganhado espaço como opção de pós-graduação e educação executiva, os cursos de gestão esportiva receberam pessoas interessadas com formação em áreas não relacionadas ao esporte.

Libia Lender Macedo, coordenadora do MBA cursado por Claro na Anhembi Morumbi, diz que houve mudanças no perfil do aluno que busca o curso, criado em 2008, e que possui parceria com o time espanhol Real Madrid. "Antes eram apenas profissionais de educação física, administração ou turismo. Hoje, recebemos gente de áreas diversas como publicidade, jornalismo e até engenharia", diz.

Além do aquecimento do mercado brasileiro atualmente, Libia acredita que após os eventos de 2014 e 2016 os profissionais com experiência terão ainda mais oportunidades no exterior, com a realização de grandes eventos em países com pouca tradição esportiva como o Qatar.

O gestor da Trevisan no Rio de Janeiro, cidade que oferece o MBA em gestão e marketing esportivo desde 2009, Ricardo Mathias, diz que a profissionalização do setor sempre foi um processo necessário. "Nossas primeiras turmas eram formadas por pessoas que já trabalhavam com o esporte, mas hoje os alunos têm formações diversas", diz.

Em São Paulo, onde a Trevisan oferece o curso desde 2000, o coordenador Antonio Paulo Terassovich diz que nos últimos três semestres as turmas aumentaram de 25 para 40 alunos. A escola tem planos de oferecer duas turmas a partir da segunda metade de 2012.

Segundo o vice-presidente da Associação Brasileira de Gestão do Esporte, Geraldo Campestrini, já existe um movimento para a criação do curso de graduação na área. Embora o Brasil possua 800 cursos de educação física, não há registro de nenhum voltado para a gestão esportiva. Na China, por exemplo, há um programa do tipo para cada curso de educação física. "A única forma de a gestão esportiva se solidificar é trabalhar esse tema desde a graduação", explica.

O aquecimento do mercado atraiu até instituições estrangeiras como a Australian College of Physical Education (ACPE), que existe há mais de cem anos no país que sediou a Olimpíada de 2000 e possui campus dentro da vila olímpica de Sydney. Integrante do grupo de ensino superior Study Group, presente no Brasil desde 2006, a universidade decidiu investir no país no ano passado, com a oferta de cursos de graduação e pós-graduação em assuntos como 'sports business' e performance de atletas.

Além disso, recebe estudantes brasileiros em programas de intercâmbio de um ou dois semestres. O gerente regional de recrutamento no Brasil, John O'Connor, diz que está apostando na profissionalização da área no país. "Já vimos esse movimento acontecer na Austrália e estamos esperando que ocorra o mesmo no Brasil nos próximos anos", afirma.

Fonte: http://www.valor.com.br/carreira/2528864/executivos-mudam-de-area-para-aproveitar-bola-da-vez-do-brasil

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